Quando criança, cultuava meus heróis. Sonhava em ser o Jaspion, o Jiraya ou um integrante dos Changeman e dos Power Rangers. Foram personagens que habitavam meu imaginário infantil com sua coragem e seus poderes especiais. Meus heróis eram os mesmos dos colegas de escola, mas os ídolos da música eram diferentes. Enquanto uns exibiam cheios de pompa o disco da Xuxa, do Polegar e do Dominó, eu falava no Medina.Na época, não sabia o que era afinação, timbre, entonação e dicção. O simples fato de ao grito de “Alô, Harmonia” milhares de pessoas enlouquecerem na avenida me encantava. E o mesmo acontecia nas quadras das escolas de samba, onde a presença do Medina garantia um espetáculo diferenciado. Fui crescendo e, junto comigo, minha admiração parecia tomar fermento. Passava tardes jogando futebol de botão, ouvindo e cantando bem alto “Antes de Samba... Semba”, antológico samba-enredo da União da Vila do IAPI gravado no primeiro vinil do Medina.
E samba-enredo sempre foi o tipo de música que mais gostei. Mas o Medina adorava colocar um axé, ou até toada dos bois de Parintins, nos repertórios das entidades em que passava. E eu, só por causa dele, aprovava. Criticava e ainda critico quando ouço axé, sertanejo, funk ou qualquer coisa que não seja samba nas quadras de qualquer escola. Mas admito que o respeito e admiração pelo Medina vencia meu radicalismo e eu aceitava todo o repertório dele.
Depois de 29 carnavais, seis títulos e um monte de prêmios de melhor da avenida, o maior intérprete que Porto Alegre já viu decidiu parar. Prefere não dar entrevistas por enquanto, mas disse que recebeu, além de propostas de outras escolas, possibilidade de renovação nos Imperadores. Declarou estar decepcionado com o carnaval e vai esbanjar seu talento apenas na Nossas Raízes, de Canoas.

Não se vislumbram formas para preencher o vazio que a folia de Porto Alegre já está sentindo por não poder mais ver em ação um dos seus maiores personagens. Talentoso, competente, técnico e responsável, deixa órfãos os devotos que deixou na Praiana, nos Acadêmicos da Orgia, no Império da Zona Norte, nos Bambas da Orgia, no Estado Maior da Restinga e, fundamentalmente, nos Imperadores do Samba, escola que mais amou e onde mais foi amado. Além de todas as entidades em que não passou, mas em que sempre foi respeitado.
Alguns argumentam que ele já não é mais o mesmo, que não demonstra mais a energia de outrora. E eu concordo, afinal, seus cabelos já foram tomados pelo branco do tempo e a saúde sofre com alguns percalços. Mas o que Medina vinha mostrando nos carnavais mais recentes ainda o mantinha como uma estrela brilhante na constelação do carnaval. E eu me oponho ferrenhamente ao seu descanso.
Mais que um intérprete, foi um mito que alcançou respeito fora do carnaval e que dentro da folia foi ídolo de muitas gerações. Sua voz límpida, potente e melodiosa vai ficar eternizada na cabeceira da avenida e na cabeça de quem ama o carnaval. Mas sempre acompanhada do desejo para que um dia voltemos a ouvir “Alô, Harmonia!” na avenida lotada.
2 comentários:
Não deixarei de fazer um mero comentário, para este lindo texto, que fala de um dos maiores e mais adorados intérpretes do RS. Luis Carlos Medina, conquistou gerações e gerações, com sua garra e tranparência que colocava em qualquer samba-enredo que interpretasse.Sou fã e continuarei sendo deste homem que levantava a arquibancada ao grito de " Alô Harmonia", sentiremos muita falta..
Mas me alegro em saber que já temos um sucessor, Sandro Ferraz, este nome já é referência para o Carnaval Porto alegrense.
Eu, que amo o carnaval, seja de porto alegre, seja do rio ou de são paulo, floripa, uruguaiana, não posso deixar de colocar umas palavras sobre Medina. Quando pequeno, lá pelos 10, 12 anos, ouvi um samba cantado por ele, a sua voz potente preencheu a sala da minha casa. Dali em diante, procurei saber quem era aquele cara q cantava um samba quente.Agora, com 28 anos e tantos de samba e carnaval, sei quem foi e quem é Carlos Medina. Construiu uma imagem e uma história dentro do carnaval do Rio grande do sul. Facaremos órfãos de Medina, mas novos talentos surgiram, tenho certeza. Mas na memória, medina reina absoluto como a primeira voz da escola de samba de porto alegre. Respeito a todos os intérpretes, mas , Carlos Medina não é uma página do nosso carnaval, e sim, um capítulo inteiro. Abç, Jefferson Souza, navegantes, porto laegre.
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